Projeto de lei PL 3535/2021 – Subtração de incapaz também no caso de guarda compartilhada

outubro 14, 2021

O deputado MÁRIO LÚCIO HERINGER apresentou o projeto de lei PL 3535/2021 que visa alterar a lei de Subtração de incapaz, “o art. 249 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, para incluir a guarda compartilhada no tipo penal de subtração de incapazes, e dá outras providências

Subtração de incapaz está gravemente desatualizada

Esta lei de 1940 é absurda.

Segundo ela um genitor que subtrai o próprio filho levando-o para um ambiente distinto da sua residência habitual não comete um crime se possuir a guarda do mesmo. 

A guarda compartilhada foi instituída somente recentemente no Brasil, mas o legislador não atualizou esta norma e o poder judiciário também não teve interesse em remodular a sua aplicação.

Como bem cita o deputado e como já tinha sido citado no livro “Sequestro Internacional de Crianças: o Brasil é Estado Requerido ou Estado Sequestrador?: Convenção da Haia de 1980” anos atrás, o STF em 2015 negou um pedido de expatriação (processo de extradição n.
1.354, caso Qvarfordt) de um genitor subtrator porque foi decidido que a subtração não é crime no Brasil.

Ora, o mesmo STF que instituiu o casamento homossexual (se desconhece um país onde esta mudança tão polemica não tenha ocorrida pelas mãos do legislador), negando texto literal da Constituição (ver ADI n. 4277), por coerência, também deveria ter atualizado o reconhecimento do aspecto penal desta violência contra as crianças.

Subtração de incapaz é uma grave violência contra as crianças

A lei da alienação parental (2010) e das garantias para as crianças vítimas de violência (2017) consideram a subtração como crime mesmo quando o subtrator é um dos genitores.

A Conferencia da Haia, por exemplo, assinala que nos seguintes países signatários a subtração de menor é considerada crime: Austrália, Canadá, Dinamarca, Finlândia, França, Alemanha, Irlanda, Islândia, Itália, Holanda, Noruega, Portugal, Espanha, Inglaterra, EUA, Suíça, Suécia, Japão.

É possível deduzir que a subtração é crime na quase totalidade dos países considerados mais ricos e/ou desenvolvidos, o Brasil não pode se manter ancorado a um passado inadimplente.

A violação do superior interesse de uma criança deve deve ser mais grave do que o furto!

A pena de “detenção, de dois meses a dois anos, se o fato não constitui elemento de outro crime” é uma grave violação dos direitos fundamentais das nossas crianças.

Desde 1990, segundo o ECA (que parece ser uma cópia da Convenção da ONU de 1989 sobre os Direitos das Crianças), quem subtrai uma criança deve responder a uma pena de 2 a 6 anos (art. 237 da lei 8.069/1990).

A pena do crime de subtração de incapaz é assustadora se comparada também com outros crimes. Por exemplo, quem rouba banalmente um carro deve enfrentar uma pena de 2 a 8 anos (art. 155 do Código Penal).

No Brasil uma criança vale menos do que um objeto qualquer!

A inexistência de pena “no caso de restituição do menor ou do interdito, se este não sofreu maus-tratos ou privações” confirma a colocação do interesse das crianças abaixo aquele de qualquer objeto.

Se observarmos o furto de um objeto, o criminoso não é abonado caso devolva a mercadoria intacta. Ao invés, subtrair uma criança e a devolver sem a ter feito sofrer anula completamente o crime!

Ora, se a subtração é uma violência contra a criança, como pode ser possível imaginar que este ato possa não acarretar maus-tratos ou privações?  Parece piada, mas não é.

Qual deveria ser o critério do crime de subtração?

O melhor modo para fazer um bom trabalho é observar o trabalho já feito por outros e procurar melhorá-los, se possível.

A historicamente muito copiada lei italiana, por exemplo, parece trazer boas indicações. No seu art. 574 C.P. estabelece que a subtração so existe se

  • quem foi subtraído possui menos de 14 anos ou deficiência psíquica, pois se considera que pessoas fora desta categoria sejam capazes de combater de alguma forma uma subtração injusta;
  • a subtração violou os direitos do genitor que exercia o poder familiar do genitor (é irrelevante a existência de uma guarda específica ou uma guarda não efetivamente exercida, basta possuir o poder de decidir sobre a transferência da residência habitual da criança), por um tutor ou curador ou por quem a estivesse vigiando;
  • a pessoa que denuncia o crime é a vítima descrita acima, ou seja, o Estado não pode intervir arbitrariamente para restaurar o status quo ante, se trata de direito privado e não público;

Talvez uma possível alteração melhorativa poderia ser o aumento do limite de idade para 16 anos, em conformidade com a Convenção da Haia de 1980.

Como a Subtração de Incapaz poderia contribuir ao combate das subtrações internacionais de menores?

A tipificação penal da subtração é importante porque desincentiva essa prática e permite a célere e necessária atuação policial para a solução destes casos.

Porém, como se sabe, alguns genitores que subtraem os filhos para outros países buscam subterfúgio na eventual criminalização para justificar a impossibilidade de retornar à residência habitual.

Uma boa solução para isto, seria, por exemplo, adicionar a condição de suspensão da pena de cárcere (os anos atribuídos resultariam apenas nos registros, mas não seria efetivado) no caso em que o subtrator retornasse voluntariamente em um prazo não superior a 3 meses, que é convencionalmente o período máximo concedido aos turistas.

Além disso, deveria ser estabelecida uma multa para cada dia que este subtrator não retornasse com a vítima, como acontece nas decisões americanas. Isto seria outro incentivo importante a uma rápida solução da lide, em coerência com o melhor interesse da criança de ter a própria guarda julgada pelo seu juízo natural.